Senti seus olhos me invadirem, assim, sem bater na porta ou pedir licença. E de algum modo, eu também mergulhei fundo no cristalino daqueles olhos castanho claro. Puxei a caneca de chá mais pra perto e fingir que estava tomando um gole, tudo para disfarçar a minha estranha vontade de olhar para aquela moça que estava fazendo um pedido no balcão. Depois do gole de chá, eu olhei a rua, mas o ímã nela puxou meus olhos de volta. E ela encontrou meu olhar desconfiado no meio do caminho do seu corpo, e fez desse olhar envergonhado um convite. Moveu-se na minha direção, com um daqueles vestidos floridos, que mesmo surrado lhe caia bem.
— Só tem esta cadeira aqui. Posso pegar?
— Sim. Pode levar.
— Há, pensava que seria uma boa desculpa pra arranjar uma companhia... Posso pegar sua companhia também?
Ela se sentou comigo e eu sorrir de canto. Havia três anos que ninguém ocupava a cadeira vazia do lado desse escritor falido, com a barba mal feita e o cabelo desgrenhado feito eu. Era minha rotina passar todo fim de tarde sozinho, tentando sentir algum gosto neste chá.
— Como estas?
— Cansado.
— De que?
— Da vida e você?
Houve um silencio.
— O que foi?
— Nada, só tive a impressão de que se me tornasse sua amiga agora, do jeito que você esta, em breve receberia a noticia de que você se suicidou.
Não pude deixar de sorrir. Porque talvez fosse verdade. No fundo eu realmente era a pessoa mais completamente desinteressante do mundo e não havia mesmo nenhuma graça de permanecer por aqui, sendo vitima da existência. Quando eu cansasse, obviamente me jogaria de um penhasco. Mas eu tenho um livro que eu não consigo passar do quarto capitulo e isso ainda me prende aqui.
— Por que você acha isso?
— Não sei.
— Um. O.k
— No que esta pensando?
— Varias coisas.
— Tipo?
— O motivo que te trouxe aqui.
— A cadeira vazia.
— Isso eu sei.
— Também sabe do outro motivo...
— Que motivo?
— Tua presença. O que esta tomando?
— Estou fingindo tomar chá.
— É bom?
— Não, é amargo.
— E por que o bebe?
— Não sei. Só bebo. Como cerveja. Todo mundo bebe mesmo sabendo que é ruim.
— Eu não gosto de cerveja.
— Você não é todo mundo.
— Tu também não...
Eu levantei os olhos e vi seus lábios se moverem dizendo uma frase que eu não conseguir entender. Ela me ganhou no desejo e eu só conseguia pensar em beijar aquela boca até ficar sem ar pra respirar. Ela perguntou o que foi, mais eu caia, sem medos, nesse desejo todo... A garçonete lhe trouxe um bolinho de tapioca, decorado com uma daquelas frescuras de cozinheiro chique. Ela tirou tudo de cima e engoli-o em duas bocadas. Enquanto isso, meu chá esfriava lentamente sobre mesa.
— O que vai fazer depois daqui?
— Pra casa.
— Me leva com você.
Ela ficou em silencio e sorriu pra mim.
— Não posso. Minha mãe mora comigo.
— E dai?
— E dai que pra mamãezinha eu sou uma moça de bons modos.
— Tudo bem. Eu pulo sua janela. — Sorrir.
— Eu moro no sétimo andar.
— Eu gostaria que o final desse encontro terminasse comigo dormindo com você. Para de dificultar as coisas.
— Tipo, na mesma cama?
— Eu e você. Na mesma cama. Na sala. No banheiro. Qualquer lugar.
Silencio..
— Hoje não.
— Lá em casa. É desarrumado mas serve.
Silencio.
— Não.
— Por quê?
— Porque eu te conheci a mais ou menos uma hora atrás.
— E também não sabe o meu nome...
Silencio.
— Qual o seu nome?
— Não teria importância se eu não tivesse falado nisso.
— Mas agora tem.
— Te digo no teu ouvido quando você estiver fazendo amor comigo.
Ela olhou pra mesa, fugiu do meu olhar, suponho eu que pensando em alguma coisa pra preencher aquele silencio que se estendeu sobre nós.
— Me beije então...
— Você que deve me beijar. Os homens sempre são mais ousados.
Eu a beijei por vários minutos. Ela me beijou por vários minutos e meio a mais.
— Eu quero você.
— Eu também.
— Então dorme comigo lá em casa?
— Hoje não.
— Hoje sim.
— Ainda não...
— Não dificulta as coisas.
Do lado de fora da janela do café da esquina, à noite subia rápida. Trazendo aqueles pontinhos brilhantes pra enfeitar o fundo negro acima da lua.
— Estou louco pra te levar pra minha cama.
— E eu, louca pra ir.
— É aqui perto. Vem...
— Não dá.
— Tá.
Levantei da mesa e andei até a porta. Não queria dá tempo pra ela pensar. Estava indo na direção do meu apartamento e ela veio atrás. Sorrir. Ela rio. Andamos um pouco até ela parar, me agarrar contra a parece, me tirar o fôlego e depois, simplesmente dizer tchau, com a mão.
— Ahhh, puta merda...
— A gente se ver...
E até hoje, nunca mais...
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Oie
ResponderExcluirSeu blog está lindooo, de verdade, amei o novo visual.
Retribuindo a visita com muito carinho, parabéns pelo espaço aconchegante, confortador, e lindo que pude ver aqui.
Deus abençoe
asoonhadora.blogspot.com
Adorei o texto, achei tão, tão... não sei explicar , hahaha, adorei, tipo. Da onde vem tanta inspiração? hahahaha, parabéns pelo post, ficou ótimo, ótimo !
ResponderExcluirAté mais :D
Excelente texto. O que não falta por aí são espíritos taciturnos querendo se encontrar...
ResponderExcluirNOSSA QUE HISTÓRIA LEGAL!! ADOREI MESMO..
ResponderExcluirABRÇS
BRUNO JP TEIXEIRA - O PORTUGA
PS: ACHO QUE ESTOU PRECISANDO DE UMA INSPIRAÇÃO ROMANTICA...
ResponderExcluirMeu Deus, to chorando, que lindo que lindo!
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